Faz algum tempo, tratei do crescimento das classes C e D como consumidores atrativos para muitas empresas (aqui).
Depois de ter publicado aquele post, a Revista Veja trouxe, na capa, uma extensa reportagem sobre o mesmo assunto (aqui, para assinantes). Algumas das informações que destaco nesta matéria:
Comparado ao meio bilhão de novos consumidores que China e Índia produziram na última década, o fenômeno brasileiro pode não impressionar. Mas é notável. É como se, nesse curto espaço de tempo, dois Portugais inteiros tivessem saído da pobreza no Brasil. O resultado disso é que, em um fato inédito na história recente, a classe C é hoje o estrato social mais numeroso do país. Segundo o estudo Observador 2008, são 86,2 milhões de pessoas, o equivalente a 46% da população brasileira (em 2005, a participação delas era de 34%). Já as faixas D e E, que representavam 51% da população em 2005, agora tiveram sua fatia diminuída para 39%.
É sempre uma boa notícia a ascensão econômica de pessoas, especialmente a caminho da classe média, notório colchão social entre os estratos mais ricos e mais pobres, capaz de reduzir as tensões sociais e conter a demagogia anacrônica da luta de classes, muito em voga na América Latina.
Se a emergência da classe C é um processo sustentável, só o tempo dirá. O que se pode atestar com certeza é que essa transformação deu novo ânimo à economia, despertando o surgimento de negócios, criando empregos e aproximando o Brasil de uma verdadeira economia de mercado. Diz o filósofo Roberto Romano, da Unicamp: "Um país em que a classe média diminua está fadado à estagnação social e econômica. O desafio agora será integrar essa massa populacional à produção de bens e serviços mais elaborados, com investimento em educação técnica, para que esse fenômeno não seja passageiro".
O cientista político Fábio Wanderley Reis, professor emérito da Universidade Federal de Minas Gerais, concorda: "O aumento do poder de consumo nas classes mais baixas, associado à estabilidade da economia, trouxe uma nova dinâmica social e resultou numa situação inédita de redistribuição de renda". Trata-se, segundo ele, de um marco na história do país, que o coloca no limiar do desenvolvimento.
Mas podemos perceber que diversas empresas têm, ultimamente, prestado mais atenção a este segmento de consumidores que vem crescendo....
Após um ano de estudos e pesquisas de mercado, a Tigre lança uma nova empresa de acessórios para banheiro, lavanderia e áreas externas voltadas para as classes C e D. Batizada de Plena, a nova empresa já chega ao mercado com um portfólio de 100 produtos, muitos deles incorporados da própria Tigre.A matéria é do Valor Econômico, na íntegra aqui. O mesmo Valor Econômico publicou (aqui) outra reportagem, desta vez tratando das novas estratégias da Deca para atingir as classes C e D:
A Plena vai atuar em um segmento em que a Tigre participava, mas de forma marginal. A companhia ainda tem no mercado produtos como tampa de vasos sanitários, lixeiras ou porta-sabonetes com a marca Tigre. Toda essa linha de acessórios desaparece do portfólio da maior empresa de tubos e conexões de PVC e passa a integrar a cesta de produtos da Plena. A nova companhia vai ampliar o que a Tigre já produzia na linha de acessórios e deve dobrar seu portfólio nos próximos dois anos.
A criação da Plena foi a maneira encontrada pela Tigre para focar suas áreas de negócio e também aproveitar de forma mais ampla o crescimento a taxas chinesas que a indústria de materiais de construção vem experimentando desde o ano passado.
A Tigre investiu R$ 25 milhões na nova companhia, que será liderada por Evandro Sant'Anna. Cerca de R$ 10 milhões foram aplicados na construção de uma fábrica na cidade mineira de Pouso Alegre, onde também ficará a sede da companhia. Boa parte dos recursos serão utilizados também em uma agressiva campanha de marketing.
A Tigre espera que a Plena esteja faturando algo próximo a R$ 100 milhões em 2010. Contando com a rede de distribuição da Tigre, a companhia inicia as vendas em cerca de 15 mil pontos de comercialização no Brasil. Para 2010, a aposta da Plena é de que seus produtos sejam comercializados em 30 mil pontos de venda.
Líder no mercado brasileiro de metais sanitários, a Deca, divisão de negócios da Duratex, agora se prepara para disputar o primeiro lugar com a espanhola Roca no segmento de louças sanitárias. Após adquirir a Ideal Standard e a pernambucana Cerâmica Monte Carlo por R$ 60 milhões cada uma, a companhia se diz pronta para ampliar a produção anual de louças sanitárias de 3,6 milhões de peças para 7,2 milhões de peças. "Continuaremos a dar foco ao mercado de luxo, mas nossa expansão passa obrigatoriamente pela classe C", afirma Raul Penteado, diretor geral da Deca.
Dona de 19% do mercado de louças sanitárias, a Deca decidiu apostar em uma expansão rápida neste setor no início do ano passado, quando ficou claro que o acesso ao crédito imobiliário para a classe C se tornaria mais amplo e as taxas de juros reais ficariam em apenas um dígito. A companhia cogitou a idéia de construir novas unidades produtivas, mas pelo fato de estar atuando perto de sua capacidade optou pelas aquisições. "Com as unidades que estão sendo agregadas à companhia nossa participação de mercado será de mais de 30% quando todas as novas fábricas estiverem completamente operacionais", diz o executivo. A Roca, dona da Incepa e da Celite, tem algo próximo a 40%.
Com as aquisições, a Deca incorporou três novas fábricas. Uma em Jundiaí (SP), uma em Queimados (RJ) e uma terceira que pertencia a Monte Carlo em Cabo de Santo Agostinho (PE). Juntas, as três unidades fabris têm uma capacidade de produção da ordem de 3,2 milhões de peças ao ano. Neste momento a antiga fábrica da Ideal Standard em Queimados não está operando. "Começaremos lá no ano que vem e vamos expandindo a produção de acordo com o aquecimento da demanda."
Assim como tem acontecido nas outras unidades da Deca nos últimos três anos, boa parte do que sair dos fornos dessas novas fábricas terão como destino os consumidores da classe C, responsáveis, segundo Raul Penteado, pela melhora na rentabilidade da Deca nos últimos anos. Desde que percebeu que haveria uma explosão no consumo no segmento econômico, a Deca iniciou um processo amplo de renovação de seu mix de produtos. A companhia investe cerca de R$ 25 milhões anuais em desenvolvimento e nos últimos três anos mais de 50% desse valor têm sido destinado ao segmento econômico. Dos mais de 200 novos produtos que colocou no mercado desde 2006, mais de 70% deles foram destinados à classe C. "É impossível crescer sem olhar para esse segmento, as margens são menores, mas é dele que vem a escala", diz.
Um dos primeiros negócios do engenheiro Olavo Setubal, criada em 1947, a Deca hoje é uma forte divisão da Duratex, subsidiária da holding Itausa que atua também no segmento de madeira, pisos laminados e chapas de fibra. Em 2007, a Deca respondeu por 34% das vendas da Duratex, que geraram receita líquida de R$ 1,67 bilhão. A expectativa entre vários executivos da companhia, que fazem questão de não o fazerem publicamente, é de que a Deca cresça 15% este ano, sobre um crescimento de outros 15% no ano passado.
Apesar de não admitir as estimativas otimistas de um ciclo de expansão forte por mais dois ou três anos, os agressivos investimentos na expansão da capacidade de produção mostram que a companhia acredita que o mercado vai passar a atuar em um novo patamar em pouco tempo. "O fato é de que estamos certos de que o boom da construção civil para as camadas mais populares ainda não aconteceu", diz um otimista Raul Penteado. "O grande crescimento nesse mercado ainda está por vir".
Além dos R$ 120 milhões que investiu na aquisição de duas concorrentes do segmento de louças, a Deca está aplicando outros R$ 120 milhões na ampliação de sua capacidade de produção em metais sanitários. Neste caso a companhia optou por não ir às compras e está construindo uma nova unidade em seu complexo de Jundiaí. "Não estamos apenas comprando mais maquinário, estamos dobrando a área física da fábrica, o que nos permitirá ampliar nossa capacidade de produção em 35% até o fim do ano que vem", diz o executivo.
Assim como no segmento de louças, a Deca também pretende ampliar ainda mais o leque de produtos de metais sanitários voltados para a classe C. "Continuaremos tendo uma torneira de R$ 2 mil, mas também queremos ter torneiras de R$ 40 nas prateleiras das lojas de construção", afirma Raul Penteado. A companhia não pretende criar uma marca específica para atuar no mercado popular ou no mercado de luxo. Independente do preço final, diz Penteado, todos os produtos serão identificados apenas pela marca da companhia.
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