16 de setembro de 2008

O modismo começa a desmoronar

Alguns podem achar que eu tenho sido radical, aqui no blog, ao atacar modismos - entre eles, a tal "sustentabilidade".

Assim, vou transcrever alguns trechos de uma matéria publicada no Valor Econômico de ontem (15/09/08):

Onda do papel reciclado começa a ser questionada

A questão atormenta inúmeras empresas. Uma onda de forte apelo ambiental - e social - nos últimos anos levou várias companhias, entre bancos, operadoras de telefonia e indústrias em geral, a trocarem pelo reciclado seus formulários, catálogos, publicações, extratos, memorandos, documentos e afins que antes eram impressos ou escritos em papel branco.

A motivação pelo papel reciclado é nobre: menos resíduos jogados nos lixões e aterros sanitários. Recuperados, os papéis são reintroduzidos na cadeia de produção de papéis para imprimir e escrever. Mas uma avaliação mais ampla do tema está mudando a forma como as empresas encaram o papel branco, tirando parte dos mitos que o reciclado acabou recebendo.

"Somos a favor da reciclagem, mas o que temos feito nos últimos tempos é mostrar aos clientes as qualidades do papel branco que segue excelentes critérios de sustentabilidade", diz Robinson Cannaval, gerente de marketing de impressão e conversão da International Paper (IP), maior fabricante de papel dos EUA. "É um engodo quem acha que ao utilizar o reciclado está salvando uma árvore na Amazônia. Na Europa, isso talvez seja verdade, mas isso não acontece aqui", afirma Cannaval. A IP tem uma linha de produção de 25 mil toneladas de reciclados por ano em sua fábrica de Mogi Guaçu (SP) com a marca ChamexEco.

Os papéis reciclados são compostos de uma mistura entre as aparas de pós-consumo (já utilizadas pelo consumidor e recolhido, por exemplo, por cooperativas formadas por catadores) e as aparas pré-consumo (refugo ou perda dos produtos não usados nas gráficas). Essa relação varia entre 25% a 30% de pós-consumo, e o restante de pré-consumo.

O preço do reciclado, que chegou a ser 20% a 30% maior do que o branco quando lançado no início da década, praticamente igualou-se. Apesar disso, o reciclado representa não mais do que 7% da produção nacional de papel para imprimir e escrever, em torno de 1,2 milhão de toneladas. Isso porque os fabricantes não conseguem atender toda a demanda por escassez de matéria-prima - faltam aparas de boa qualidade.

A realidade é diferente da que acontece nos EUA e Europa. Lá, os papéis reciclados para imprimir e escrever, coletados em sua maioria pelas famílias e empresas, são fabricadas com aparas de melhor qualidade. São mais brancos do que os convencionalmente encontrados no Brasil cuja aparência é ligeiramente bege de modo a disfarçar as imperfeições. Para o papel reciclado do Brasil ficar igual ao similar estrangeiro, isso significa um maior consumo de energia, água e químicos para bem tratá-los e convertê-los ao processo de produção.

"Do jeito que é hoje, a produção de papel reciclado para imprimir e escrever no Brasil não traz vantagem do ponto de vista ambiental", diz o gerente geral de impressão e conversão da IP, Antonio Gimenez. Segundo ele, a alta demanda por este tipo de papel acabou criando distorção, gerando uma competição sem igual pelas aparas que antes tinham destino a produção de embalagens ou papéis sanitários - produtos que exigem tratamentos inferiores do que os papéis de imprimir e escrever para readequá-los ao ciclo de produção.

Um estudo realizado pelo Laboratório de Química, Celulose e Energia da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da Universidade de São Paulo, solicitado pela IP, mostra que, no processo industrial, se gasta mais energia, água e químicos para produzir o papel reciclado do que fazer o mesmo processo utilizando fibras virgens.

Apesar de o estudo fazer uma comparação com uma realidade inexistente no país (utiliza-se como parâmetro um papel com 100% de aparas pós-consumo), o estudo, coordenado pelo professor Francides Gomes da Silva Júnior, indica que o consumo de água no reciclado chega a 64 metros cúbicos por tonelada - acima dos 10 metros cúbicos do papel de consumo do papel de fibra virgem. Se a fábrica de papel for integrada a uma unidade de produção de celulose, consome-se mais 35 metros cúbicos de água - ainda assim abaixo da produção do reciclado.

A fase mais complicada para a produção do reciclado, segundo o estudo, está no processo de destintamento das aparas pós-consumo. Nesta etapa, são usados diversos produtos químicos - peróxido de hidrogênio, hidróxido de sódio e enzimas - para remover as tintas impressas ou escritas no papel.

O resultado é uma geração de resíduos sólidos, incluindo metais pesados, que precisam ser tratados. Como resultado, a polpa - a matéria-prima a ser reaproveitada como papel reciclado - é menos branca, com características inferiores de aparência, resistência e desempenho em relação ao papel branco.

Conta ainda a favor do papel branco produzido a partir de florestas plantadas o fato de as árvores capturarem mais gás carbono da atmosfera. No caso do reciclado, esse seqüestro já aconteceu.
Para Robinson Cannaval, da IP, a questão é escolher o papel conforme ao tipo de uso, evitando os excessos e desperdícios. "Se a empresa deseja imprimir um código de barras, é melhor optar por um papel branco porque se terá um maior contraste. Se for um reciclado, a empresa teria de pintar uma tarja branca para se obter o mesmo resultado. É um gasto a mais em tinta."
Isso é o que dá começar a adotar um modismo só para ser igual às outras empresas !
As empresas que começaram a substituir os papéis brancos pelos reciclados o fizeram sem nenhum tipo de análise, sem NENHUM CRITÉRIO - apenas e tão somente para entrarem na "moda" do reciclado.

Este é o grande problema com os modismos.....

O leitor mais atento deve lembrar-se da "bolha das empresas ponto.com".
Naquela época, eu lembro de ter escrito um artigo que, basicamente, questionava o fato de uma empresa totalmente virtual ter sido avaliada com um valor de mercado semelhante ao do Banco Banespa (naquela época, ainda não havia sido adquirido pelo Santander).

Havia, naquele momento, uma irracionalidade envolvendo as empresas "ponto.com".
Exatamente como temos, hoje, a mesma irracionalidade envolvendo a tal "sustentabilidade".
As empresas adotaram o discurso da sustentabilidade, mas sequer entendem o que isso significa.

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